sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O Livro dos Espíritos: uma obra ímpar


O Livro dos Espíritos: 
 uma obra ímpar


 Existiu na França, no século XIX, um professor, filósofo, cientista, escritor e poliglota (tradutor, com domínio do alemão, inglês, italiano e espanhol), profundo conhecedor do magnetismo, ciência que estudou por cerca de 35 anos. Sua personalidade era tida como grave e compenetrada, mas também possuía alma boníssima. Era filho de um juiz de direito que, durante a infância e adolescência do futuro professor, o encaminhou para Yverdun, na Suíça, onde ele se submeteu à pedagogia de um dos maiores pedagogos da época, cujos métodos de ensino ainda hoje influenciam escolas do mundo inteiro, Johann Heinrich Pestalozzi. O futuro filósofo aprendeu, com Pestalozzi, desde jovem, a nada aceitar cegamente, a tudo submeter ao crivo da razão. Seu nome civil foi Hippolyte-Léon Denizard Rivail, o qual, dotado de imenso amor à educação, durante muitos anos foi professor de gramática francesa, aritmética, física, química, astronomia e outras disciplinas, além de ter escrito algumas obras de destacado relevo relacionadas à educação, uma delas premiada.

 Como demonstração da mente racionalista de Rivail, e também como constatação do seu imenso bom senso, recolhemos, na obra de Torchi[1], a frase escrita pelo futuro codificador do Espiritismo quando, aos 24 anos, seu espírito fundamentalmente positivista, na juventude, escreveu em obra sobre Educação Pública: “Aquele que houver estudado as ciências rirá, então, da credulidade supersticiosa dos ignorantes. Não mais crerá em espectros e fantasmas. Não mais aceitará fogos-fátuos por Espíritos”[2].

 Pois foi esse mesmo Rivail que, cerca de três décadas mais tarde, entrando na madureza de seu espírito, foi chamado a observar “estranhos fenômenos”. E, após certo tempo de hesitação e dúvidas, resolveu investigar  in loco as chamadas manifestações das mesas girantes, muito em voga na Europa, em especial na França, ali pelos anos cinquenta do século XIX. E viu. E ouviu. E percebeu, naqueles fenômenos, que serviam como entretenimento às almas vulgares e de estudo e reflexão às almas elevadas, que neles poderia estar contida a maior das revelações de uma nova ciência. Adotou, então, o pseudônimo de Allan Kardec.

 Assim viria a lume a obra intitulada O Livro dos Espíritos, inicialmente com 501 questões e já na segunda edição com 1019 perguntas, cujas respostas foram obtidas com a ajuda de médiuns, em especial mulheres, algumas delas ainda adolescentes. As informações obtidas por Kardec e sua equipe eram surpreendentes. Anunciavam a proximidade do surgimento breve de uma nova Era para a Humanidade e deram origem ao desdobramento dessa obra em quatro outras, que completaram seu trabalho gigantesco de codificação da Doutrina Espírita: O Livro dos Médiuns, O Evangelho segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno e  A Gênese. Estava assim completo o denominado Pentateuco kardequiano, embora, em sua modéstia, este jamais tenha se atribuído a autoria do extraordinário conteúdo dessa obra. Considerava-se um mero compilador dos ensinos dos Espíritos. 

 Mas Allan Kardec viria a ser reconhecido posteriormente como o Codificador da Doutrina Espírita, pois seu trabalho foi muito além de simplesmente organizar e dispor as questões que deram origem a todo o edifício do Espiritismo. Comparava as respostas, rejeitava o que não estava de acordo com o “consenso universal”, por orientação das entidades superiores que o inspiravam e sob a direção suprema do Espírito de Verdade. Refletia sobre as respostas, analisava-as, elaborava comentários de grande sabedoria e deduzia as consequências morais e a renovação para a Humanidade advindas do conhecimento e prática dessa Revelação.

 O Livro dos Espíritos, base de todas as demais obras da Codificação, foi desmembrado por Allan Kardec, sempre sob a supervisão e orientação do Espírito de Verdade, em quatro livros: o primeiro, com quatro capítulos, trata sobre “As Causas Primeiras”; o segundo, com 11 capítulos, aborda o “Mundo Espiritual ou dos Espíritos”; o terceiro, em doze capítulos, expõe-nos “As Leis Morais”; e o quarto, as “Esperanças e Consolações” em dois capítulos.

 Na introdução de O Livro dos Espíritos, somos esclarecidos sobre a ciência espírita, que se baseia nas relações do mundo material com o dos Espíritos, os seres inteligentes do mundo espiritual. Com base na moral de Jesus, a obra aborda os seguintes capítulos: Existência de Deus; Imortalidade da Alma; Reencarnação; Pluralidade dos Mundos Habitados e Comunicabilidade dos Espíritos.

 Prolegômenos é o nome do capítulo seguinte. Nele, lemos o anúncio dos Espíritos de que “são chegados os tempos marcados pela Providência para uma manifestação universal”. Os Espíritos superiores são os ministros de Deus e os agentes de sua vontade. Sua missão é instruir e esclarecer os homens, abrindo-se “uma nova era para a regeneração da Humanidade”. Com humildade, Kardec sempre se exime da autoria da obra, a qual atribui aos Espíritos superiores que lhe transmitem seus ensinamentos elevados.





 [1] TORCHI, Christiano.  Espiritismo passo a passo com Kardec. 2. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2008, p. 61.


 [2]   WANTUIL, Zeus; THIESEN, Francisco.  Allan Kardec.   Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2004, v. I, parte segunda, cap. I, item 4. Apud. TORCHI, op. cit. na nota n. 1 acima.


 [3] KARDEC, Allan.   Obras póstumas. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2009, p. 369.


Nenhum comentário:

Postar um comentário